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Os estudos da Cultura Escrita moderna, no que se refere aos usos da correspondência pública e privada como fontes históricas e objeto de análise, têm mobilizado o interesse de especialistas de diferentes campos do conhecimento, conferindo atualidade e diversidade à produção acadêmica nas áreas de História, da Filologia, da Linguística e de Arquivos, por exemplo. O objetivo principal desta mesa é apresentar possibilidades de abordagens interdisciplinares das cartas de amizade e de ofício produzidas por D. Luís de Almeida Portugal Soares Alarcão Eça Melo Silva e Mascarenhas, 5º conde de Avintes e 2º marquês do Lavradio, governador da Bahia (1768-1769) e vice-rei do Estado do Brasil (1769-1779). Tal correspondência é um dos mais significativos conjuntos documentais de que se tem notícia; representativo de uma cultura escrita e de uma prática epistolar características da Época Moderna, especialmente, do século XVIII. Único meio de comunicação capaz de superar a distância que separava os homens da governação dos seus parentes, aliados e autoridades a quem deviam prestar contas em Lisboa, o epistolário do marquês do Lavradio (e o de outros agentes da administração colonial) permitia em termos de sua produção e circularidade, segundo Adriana Angelita da Conceição, a realização da “sensação de fala” do governador e vice-rei, no momento em que escrevia aos seus interlocutores em Portugal e no ultramar, e da “sensação de escuta”, experimentada pelos que liam as cartas de amizade e de ofício enviadas de Salvador e do Rio de Janeiro. A historiografia luso-brasileira contemporânea registra contribuições importantes sobre a utilização de cartas para o estudo da comunicação política entre as diversas instâncias da administração colonial e a metrópole, e para investigações da trama de redes de poder, parentesco e sociabilidade entre os agentes da governação e seus interlocutores na Corte, um dos objetivos analíticos desta mesa-redonda. Por outro lado, em uma perspectiva filológico-linguística, o epistolário do marquês do Lavradio, entendido como um conjunto representativo de fontes documentais para a história da língua portuguesa permite o exercício da prática filológica de leitura, fixação e edição de textos antigos, o que possibilita o mapeamento das práticas de escrita e das tradições discursivas do gênero epistolar no século XVIII. As edições elaboradas podem despertar interesses múltiplos, desde os aspectos paleográficos, diplomáticos e codicológicos, até os mais puramente linguísticos, como os gramaticais e lexicais. A documentação redigida por um lusitano em solo brasileiro apresenta um potencial singular para as discussões em torno do português no e do Brasil, assim como no que se refere à correlação entre a norma efetivamente praticada e a norma predicada por instrumentos diversos como gramáticas, dicionários e compêndios destinados ao ofício dos secretários. Entre os estudos da produção e da circulação da correspondência moderna, os aspectos referentes à conservação abriram novos caminhos interpretativos a partir de abordagens interdisciplinares entre História e Arquivo. Assim, ao compreender a carta como textualidade e materialidade, investigar a trajetória no tempo de tais documentos, representada por uma complexa dispersão custodial, permite que se problematize a burocracia do governo colonial envolvida pelas intenções administrativas do governo e das Casas nobiliárquicas. Nesse sentido, o que forma atualmente o que se conhece como o epistolário do marquês do Lavradio é o resultado de distintas escolhas familiares e públicas que possibilitam, inclusive, problematizar os rumos da historiografia luso-brasileira sobre o período em meio ao acesso ou não a tais documentos. Portanto, estas distintas frentes analíticas que aportam abordagens interdisciplinares sobre um mesmo conjunto documental justificam a escolha do tema para o debate com a comunidade de especialistas em história colonial.
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